Na região de Aveiro continua-se a assistir a um apetite voraz por novos residentes, que quase parece querer fazer esquecer os resultados ruinosos da bolha imobiliária tão recentemente ocorrida e as consequências daí advindas para a economia em geral e para cidadãos e empresas em particular.
Decisores e licenciadores, teimam em não aprender com os erros do passado recente que estiveram na origem da atual dispersão e fragmentação irracional dos espaços urbanos da região e que geraram deseconomias para as muitas gerações vindouras, criando excedentes e também custos elevados de exploração e de manutenção de infraestruturas e equipamentos.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), uma das patologias que afeta o território nacional – e que se manifesta também na nossa região - é o sobredimensionamento das redes de equipamentos e de infraestruturas, com os custos desmesurados que lhes estão associados e sem correspondência com as necessidades reais determinadas pela estrutura demográfica. Contudo os excessos não se ficaram pelos sistemas urbanos, também se traduziram em excesso de edificado para habitação, comércio e serviços, para os quais falta a procura, o mercado e naturalmente as gentes que lhes deem, pelo menos, o mínimo uso.
Este assumido flagelo da regressão demográfica, apesar de já integrar as preocupações técnicas de várias áreas do saber científico - como se pode observar, por exemplo, em projeções demográficas de 2014 do INE para Portugal –, ainda teima em resistir a entrar nos discursos políticos municipais sobre a forma de medidas de ação concretas, devidamente materializadas no terreno. Assiste-se, ainda nos dias de hoje, a decisões e licenciamentos que põem em causa a equilibrada distribuição das cargas urbanas sobre o território, a preservação do património, e uma justa e igualitária redistribuição territorial dos benefícios económicos decorrentes do insaciável apetite pela densificação dos centros urbanos já consolidados – nomeadamente através de processos de regeneração e reabilitação urbana “economicamente viáveis”.
As projeções demográficas avançadas para Portugal pelo INE, têm símile em todo o país, não ficando sequer a salvo do recuo demográfico as cidades médias e os municípios urbanos do litoral, habituadas a secar demograficamente as regiões rurais periféricas e interiores que gravitam na sua área de influência - com a mais branda complacência de governantes e respetivas políticas territorialmente pouco solidárias, e castradoras do caduco dever constitucional que advoga promoção da coesão de todo o território nacional.
Veja-se como exemplo, o concelho sede de distrito e polarizador da região de Aveiro. Este perdeu segundo dados do INE, em apenas quatro anos, entre 2010 e 2014, cerca de 1.528 habitantes (população residente), tendo no entanto sido construídas em igual período mais 1.126 habitações (alojamentos familiares clássicos)! A necessidade de crescimento do número de casas, nos últimos anos era explicada pelo crescimento populacional, pela necessidade de renovação do parque habitacional, e também, pelo crédito ao desbarato... Contudo, atualmente o número de 1,85 habitantes por alojamento (em 2014 no concelho de Aveiro) constitui um preocupante valor que se traduz cumulativamente em mais casas vazias ou devolutas, famílias mais pequenas ou mais fraturadas, menos irmãos, ou ainda, pessoas a viver mais sós.
Não sendo certamente este o caminho que se ambiciona para os nossos núcleos urbanos, procura-se com o presente artigo sensibilizar os responsáveis dos municípios da região para esta preocupante problemática, no sentido de se tomarem muitas medidas possíveis, também ao nível local, as quais devolvam as perdidas perspetivas aos jovens casais, a qualidade de vida às famílias, a compatibilização das modernas exigências da paternidade com o trabalho, etc.
Independentemente da necessidade de se implementar tais medidas - que também já tardam -, verdadeiramente promotoras da família, da natalidade e da imigração – qualificada e não predadora dos territórios periféricos e interiores -, urge repensar a política urbanística a encetar para o futuro, a qual tenha por base a racional adequação de planos e projetos urbanísticos, aos reais quantitativos populacionais sustentadamente expectáveis no curto e no médio prazos.
Para muito pesar dos empreendedores do imobiliário, os tempos do el dourado habitacional, da explosão demográfica do século XIX, não voltam. Se a farsa mal encenada e rusticamente afigurada pelos governantes já em campanha, a que chamam retoma, nos trouxer os devaneios económicos e territoriais de volta, apenas a aposta num contador de almas idas, nos pode salvar do inexato destino de tantas casas por ocupar, tantas lojas por arrendar, tantos escritórios por vender e tantos “lotes” infraestruturados por preencher...
(Publicado - sem cartoons - no Diário de Aveiro em 17 de Agosto de 2015 )
Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico
Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico
Manuel Teixeira
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