quarta-feira, 11 de março de 2015

“Dois horários, uma única região”

Dois cidadãos que vivam na área de influência da Comunidade Intermunicipal da Região de Aveiro (CIRA), experimentam desigualdades de vária ordem, das quais importa que se tome uma consciência pública generalizada.

Um exemplo: uma assinatura mensal em transporte público na Linha do Norte pode custar 57% mais, se um cidadão se deslocar de Aveiro para sul, em vez de para norte, os mesmos 28 km, dentro da mesma região.

Outro exemplo: um funcionário público desta mesma região, com exatamente o mesmo perfil laboral (numa autarquia, com igual carreira profissional, competências, funções, vencimento bruto), aufere menos 13% por hora em função da taluda geográfica – dado que sem qualquer outros critérios inteligíveis que não os meramente políticos ou da caprichosa casuística, o trabalho semanal rifa nas 35 horas ou nas 40 horas semanais. Naturalmente que vozes mais astuciosas, dirão que cabe ao governo esclarecer sobre as acidentadas interpretações do assunto, dado que os argumentos e racionalizações usadas são de caráter objetivamente artificioso, particularmente nos campos do direito, da moral e da política, pois são fundados em casos politizados e não em regras gerais e objetivas. Muitos autarcas aplicam as 35 horas tendo em vista favorecer ou resolver o “problema” dos seus restritos funcionários, sem levar em conta o bem coletivo regional ou mesmo nacional.

Em termos práticos, uma coisa é certa, desde que a medida das 40 horas semanais entrou em vigor em agosto de 2013, existem dois trabalhadores na região, iguais, mas com tratamentos desiguais, um já trabalhou desde essa data cerca de 19 meses (a 35h/semana) enquanto o outro teve um agravamento de 14%, equivalendo o mesmo período a 21,7 meses de trabalho (dado que trabalha 40h/semana). Se houvesse alguma razão de natureza gestionária percetível (incentivo à fixação laboral em territórios periféricos, aposta nos serviços públicos específicos, reforço de serviços turísticos alargados, coesão territorial, etc.), o cidadão certamente saberia honrar a determinação de forma respeitosa.

Estes são apenas dois exemplos de desigualdades não expetáveis numa região que se quer moderna e justa, pois não estão intrínsecas a maiores ou menores índices de interioridade decorrentes da localização específica de cada município no território regional, ou qualquer outro critério inteligível. O estranho da situação, reside nas inexplicáveis discrepâncias ocorridas num território que se pretende unitário enquanto entidade geográfica regional e em busca da sua afirmação nacional através de uma identidade e autonomia próprias.

Fica aqui plasmada a esperança de que as mentalidades com responsabilidades governativas, se consciencializem para a evidência de que não poderá haver uma apreensão de uma identidade regional pelos seus cidadãos, enquanto não houver uma ação conjunta e concertada em torno da defesa de desígnios comuns - os quais incluam obrigatoriamente o tratamento igualitário dos seus cidadãos. Nesse sentido, importa romper com uma tradição na qual a região tem sido subserviente de lógicas setoriais nacionais, assumindo uma postura negocial mais forte a nível regional e nacional, isto se a ambição se consubstanciar na sua afirmação enquanto região metropolitana nacional, europeia, solidária, coesa, dinâmica e inovadora.

Manuel Teixeira (artigo publicado no Diário de Aveiro de 10 de Março de 2015)


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